sábado, fevereiro 19, 2005

jac fala sobre a televisão em portugal


[José Alberto Carvalho deu uma entrevista a um jornalista do Correio da Manhã, publicada hoje que me parece pertinente, daí ter tirado alguns excertos. Voilá.]

E, em sua opinião, o que é que ainda falta à informação da RTP?
Precisa um bocadinho mais de preocupação plástica, na concepção das reportagens, por exemplo. Precisamos de aumentar o espaço dedicado à média e grande reportagem. É muito importante ter registos diferentes de reportagem no ‘Telejornal’. Acho que é importante que os jornais constituam momentos de reflexão sobre outro tipo de matérias, que não estão habitualmente na agenda mediática televisiva.

Como por exemplo?
Olhe, estamos neste momento, por exemplo, a fazer um trabalho sobre células estaminais, que foi um grande assunto de campanha nos Estados Unidos, mas que aqui passou ao lado dos portugueses. Mas é um assunto completamente actual. Devemos ter preocupações sobre o desenvolvimento científico e tecnológico, sobre a alteração de comportamentos dos portugueses, sobre a maneira como os portugueses olham para si próprios.

Quais são, afinal, as diferenças entre o ‘Telejornal’, o ‘Jornal da Noite’ e o ‘Jornal Nacional’?
Há atitudes muito diferentes perante as notícias e que o público consegue valorizar e apreciar. Não é só a atitude, é também a agenda e o alinhamento.

“MARCELO É UM LIVRE PENSADOR”

O que tem Marcelo para oferecer à RTP?
Tem para oferecer as reflexões de um livre pensador. Cada povo precisa de pessoas que reflictam livremente sobre o crescimento da sociedade. A informação não é apenas as notícias, é também a leitura, o enquadramento, a interpretação.

Ao que foi dado saber, será um modelo muito idêntico ao utilizado pela TVI, ainda que fora do ‘Telejornal’ e bastante mais curto
Em primeiro lugar, há uma limitação com o tempo, há uma preocupação com os temas, que não serão exclusivamente políticos. Mas vamos lá ver: nós estamos a falar de Marcelo Rebelo de Sousa, não é qualquer um. Ele é um livre-pensador de Portugal. Se bem me lembro, os programas de Vitorino Nemésio ou do professor Agostinho da Silva eram únicos. Os programas dos grandes comunicadores são sempre uma marca e tornam-se indissociáveis dos seus protagonistas.

O secretário-geral do PS, José Sócrates, já alertou a RTP para o facto de, como estação de serviço público, estar obrigada à pluralidade de opiniões. Como reage a este comentário?
É uma observação normal. Os portugueses sabem que a RTP está obrigada a um dever especial de pluralidade. Por essa razão, é a única estação generalista que mantém com regularidade programas de entrevista e debate de ideias.

Como é que um profissional da RTP convive com as suspeitas, que recorrentemente são lançadas, sobre o peso do Estado na estação pública?
Há sempre uma tendência para exigir que a RTP ouça toda a gente da mesma maneira. O conceito de independência que se aplica a outros é sempre muito diferente do que se aplica a nós.
E isso é natural?
Não, não acho. Se eu penso que a única diferença que existe é entre bom e mau jornalismo, não posso achar natural essa dualidade de critérios.

E onde é que se revela essa dualidade de que fala?
Respondo-lhe com uma pergunta: acha que a RTP poderia ter feito um frente-a-frente entre o líder do PS e o do PSD, como o que a SIC e a 2: organizaram? À RTP exige-se muito mais, olha-se sempre com outros olhos.

Mas reconhece que o poder político tem essa tentação de controlar os conteúdos da televisão pública?

Não sei, eu pessoalmente nunca o senti. É uma daquelas coisas que toda a gente diz que existe, mas que depois ninguém consegue provar.

OS TENTÁCULOS DO PODER

De qualquer forma, episódios como os do ministro Gomes da Silva ou, na semana seguinte, as palavras de Morais Sarmento sobre o controlo por parte do Estado dos conteúdos da televisão pública, não indiciam isso?
Se me está a perguntar se o poder político procura condicionar a agenda dos media, bem, isso parece-me uma inevitabilidade. Já se fizeram dezenas de filmes em Hollywood sobre isso.

A questão está em saber como é que os media, e sobretudo a RTP, podem fugir a essa inevitabilidade
Acho que pode fugir sendo o mais transparente possível no seu trabalho. A vantagem da concorrência é que as pessoas podem comparar. Se os espectadores sentem ingerência ou manipulação da informação, reagem negativamente.

AVENTURA “IRREPETÍVEL” NA SIC

Mantém muitos amigos em Carnaxide, na SIC?
Mantenho, mantenho. Houve muita gente que mudou, entretanto. Hoje em dia, quando vejo a SIC, há muita gente que não conheço.

Tem saudades dos tempos gloriosos de montar a primeira televisão privada em Portugal?
Foram tempos irrepetíveis. Todos nós temos essa noção e temos pena. Quem passou por aquela experiência avassaladora de entrega total, lamenta que tenha acabado. Independentemente do percurso que cada um seguiu, aquele foi um momento mágico. O melhor de todos das nossas vidas profissionais e recordamos sempre com um brilhozinho nos olhos...

Como são as suas relações com Francisco Pinto Balsemão?
São normais e cordiais. É uma pessoa simpática, tem um percurso profissional invejável e único, que deve ser louvado. Ele tem um grande envolvimento com aqueles projectos e tem uma grande vantagem: foi jornalista.

“HÁ MUITO PARA FAZER NA RTP N”

Olhe que não, a génese dos canais é muito idêntica: ambos nasceram de dois projectos informativos falhados e megalómanos, casos do CNL e da NTV.
É um facto. Essa génese é, de facto, semelhante. Mas a SIC Notícias nasceu claramente para ser aquilo que é, um canal informativo, enquanto a RTP N tem vindo a tentar definir-se à medida que vai fazendo o caminho. Mas reconheço que há um enorme trabalho a fazer em relação à N. Um enorme trabalho

Dentro de meses, a TVI lança no cabo o seu canal de informação, com enfoque especial para a economia. Há espaço e mercado para todos?
Parece-me difícil. Estou expectante em ver esse canal. Aliás, já estou expectante há muito tempo. Será que Portugal tem assunto suficiente para um canal de economia?
in CM

Sem comentários: