sexta-feira, junho 06, 2014

i can see clearly now the rain is gone

I can see clearly now the rain is gone.
I can see all obstacles in my way.
Gone are the dark clouds that had me blind. 
It's gonna be a bright (bright)
bright (bright) sunshiny day.

I Can See Clearly Now, Johnny Nash


Os carros não têm só uma utilidade prática de nos levar de um sítio para o outro. Mesmo parados são também casulos que nos colocam no meio da realidade, menos visíveis e mais contemplativos.
Se estivermos a ouvir música no rádio ainda melhor para esta reflexão tão humana e tão moderna. Podemos estar no meio da cidade a olhar para os outros carros a passar a velocidade ou apenas a observar pessoas a fazerem a sua vida. Malta de pijama a levar o lixo à rua, idosas a passear, mães a levarem os filhos para o infantário ou jovens a irem de mochila para mais um dia recreio e escola.

Esta contemplação quase voyeur é melhor dentro de um carro. Temos a música a acompanhar o pensamento (ou vice versa). Estamos sentados e protegidos de vento, chuva ou de outros elementos e podemos meramente pensar e observar. O efeito reflexivo é semelhante se formos para uma falésia ou para o campo observar o mar ou a natureza no horizonte. Provavelmente a olhar a beleza da natureza vamos pensar mais em nós e no que fazemos aqui, já que com a natureza não temos o elemento humano a distrair-nos de nós próprios. A certa altura apetece-nos abrir a porta e entrar de novo no mundo, sentir o vento na cara e olhar sem casulos.


Tudo isto faz-me lembrar este anúncio aqui por baixo da Nescafé, com esta música maravilhosa de Johnny Nash. Desde que era miúdo que me lembro de ver este anúncio. Parava tudo o que estava a fazer para ver aquela miúda gira no carro a olhar o horizonte. Estava-se a passar alguma coisa especial ali. Não era um mero anúncio. Para mim nunca foi.
A música tocava enquanto ela estava no carro e, de repente, parava. Ela procurava algo na parte de trás do carro e encontrava a lata de café. Sem se ver pormenores, ouvia-se o a abrir da tampa, o ferver do café e o servir para a chávena. Maravilhoso. Depois ela saia do carro de chávena em punho e usufruía do café, da vista e da brisa do mar, la la la. Perfeito. Poucos anúncios acertavam tanto de forma tão simples. Delicioso momento humano. 

--
PS: Ter auscultadores e ouvir música (no iPhone, iPod e afins) pelo meio da multidão ou da natureza cria efeitos semelhantes. Mas de carro estamos mais protegidos de tudo, num perfeito casulo só nosso. E podemos ser mais observadores passivos, de outros humanos ou da natureza.


Sem comentários: