Francisco José Viegas
"Com a idade, suponho que é com a idade, deixei de gostar tanto da noite – e das noitadas. Antigamente, há uns anos, a “vida literária” começava depois das dez e meia da noite e avançava até à primeira luz da madrugada. Refiro- -me ao acto de escrever, propriamente dito, à conversa com amigos.
Depois, e suponho que é da idade, mas não apenas da idade, passei a gostar de acordar muito cedo, pelas três e meia da manhã: é a hora ideal para trabalhar. Oiço os carros na rua (moro no Estoril, perto da marginal), a última gente que passa. Duche. Fazer a barba. Vestir. Tomo o pequeno-almoço na cozinha, fumo a primeira cigarrilha na varanda, tudo coisa para um quarto de hora – e sento-me ainda antes das quatro. Começo a escrever. Isso acontece quando tenho o livro preparado (falo de ficção), uma espécie de guião destinado a ser torpedeado capítulo a capítulo.
(...)
Este ritmo dura até ao final da manhã (interrompo para preparar o pequeno-almoço dos meus filhos) e corresponde àquele período em que “termino um livro”, dois meses, três meses depois de um ano de preguiça e de outros trabalhos. Vou, durante esse tempo coleccionando recortes de jornais, fotografias, pequenas notas sobre personagens; tudo ao acaso, sem disciplina. A única disciplina verdadeira aparece quando o livro pede conclusão, que se termine a história.
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Vou, durante esse tempo coleccionando recortes de jornais, fotografias, pequenas notas sobre personagens; tudo ao acaso, sem disciplina. A única disciplina verdadeira aparece quando o livro pede conclusão, que se termine a história.
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Portanto, há uma diferença entre escrever e escrever. Escrevo de madrugada para escapar aos ruídos do dia e porque toda a gente sobre quem escrevo está a dormir a essa hora – personagens vivos ou apenas de papel. De resto, não há segredos. Só insistência, correcções sobre correcções, e um livro que avança.", in Time Out
quarta-feira, janeiro 30, 2008
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