segunda-feira, dezembro 31, 2007

ouvir dizer, lendo

2008? Porreiro, pá
"Drummond de Andrade, poeta universal (embora brasileiro de Itabira por nascimento) que sempre andou às voltas com o tempo, também se atormentou com as passagens de ano em pelo menos três dos seus poemas. Começou precisamente com Passagem de Ano, em 1945, ainda o mundo tremia pelos efeitos da guerra, com este aviso: "Surge a manhã de um novo ano./ As coisas estão limpas, ordenadas. (...) A vida escorre da boca,/ lambuza as mãos, a calçada./ A vida é gorda, oleosa, mortal, sub-reptícia." Quarenta anos passados, ainda não se livrara do peso. Em O Ano Passado, de 1984, escreveu: "O ano passado não passou,/ continua incessantemente. (...)/ As ruas, sempre do ano passado,/ e as pessoas, também as mesmas,/ com iguais gestos e falas. (...) Não consigo evacuar/ o ano passado." Só em Receita de Ano Novo, de 1977, sugeriu esta visão (agora muito em voga, citada em blogues e até no YouTube): "Para ganhar um ano-novo/ que mereça este nome,/ você, meu caro, tem de merecê-lo,/ tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,/ mas tente, experimente, consciente./ É dentro de você que o Ano Novo/ cochila e espera desde sempre." Façamos-lhe a vontade, a ver o que sai. "

(...)

"As passagens de ano são uma coisa estranha. Em milissegundos vai-se o ano velho, chega o novo, ninguém dá pela troca porque está tudo eufórico mas o relógio começa logo a traduzir (e a gastar) o recém-nascido em segundos, minutos, horas, meses. Até que o novo ano se torna velho e tudo se repete. A isto nos fomos habituando. "
crónica de Nuno Pacheco, in Público

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