sexta-feira, março 10, 2006

simone em entrevista

Simone (en) canta com Represas
«Há falta de intercâmbio cultural»
Entrevista. A cantora brasileira, Simone, que emprestou no seu último album (Baiana de Gema) a voz quente e melodiosa a músicas escrita por Ivan Lins, canta esta noite no Coliseu de Lisboa com o português, Luis Represas. Simone explicou [nesta entrevista realizada dia 1 de Setembro de 2005 que saiu, em parte, no jornal Destak] um pouco da “sua música” e criticou a falta de intercâmbio entre os dois países.

por João Tomé

Com tantos anos de carreira a Simone já passou por muitos palcos e viveu muitas experiências. Considera que as suas bases musicais são as mesmas de quando começou? O que evoluiu?
Existem cada vez mais pessoas mais novas. Eu sou contemporânea no meu estilo musical, assim como o Milton Nascimento que foi a minha principal base musical no inicio. Mas como hoje em dia há muitas pessoas e tendências novas e agora, faço mais um junção entre essas gerações. Acho que é assim mesmo, você têm uma base, uma estrutura que se contrói e ali se vai juntando experiências novas e enriquecendo a base.

Que tipo de influência tem Milton Nascimento na sua carreira/música?Neste show canto duas músicas do Milton Nascimento, o Encontros e Despedidas, e aquela que gravámos recentemente juntos, o Cigarra. Agora canto menos músicas dele mas inspirei muito no início da minha carreira foi muito importante e tinha muitas canções dele. Mas são músicas que fazem parte da carreira dele e da minha como cantora, como também o Maria Maria, e são actuais. Uma das coisas mais importantes na música é que se pode cantá-la durante 30 anos e ela não perde a actualidade. Há músicas que perdem algo com o tempo e ficam, mas há outras que não, que caminham no tempo, como se tivessem sido feitas hoje.

Nos últimos anos têm surgido novos compositores e cantores na música brasileira, como Adriana Calcanhoto, entre outros. O que dão de novo à música brasileira estas novas gerações? Sim, sem dúvida. A gente tem a geração anterior, que é a minha, e mais uma posterior. Cada geração tem o seu som, a maneira de cantar, a maneira de dizer e de se expressar. Cada uma delas tem os seus ídolos, os seus mitos, os seus Fernandos Pessoa. Só existe um Fernando Pessoa, o que não quer dizer que novas gerações de poetas, não tenha outros mitos. A soma das experiências das gerações diferentes, só são coisas boas. Você só aprende mais. A geração da Adriana [Calcanhoto] e da Zélia Duncan, que estão a fazer um trabalho líndissimo, mostra coisas novas que vão aparecendo que dão algo mais também há minha música.

Como faz a selecção das músicas e dos compositores nos seus albums?Algumas e eu peço que faço, outras são músicas que já tinha ouvido e gostaria de cantar. E eu vou ouvindo músicas que me emocionam, se me dizem coisas, não importa quem escreveu, até prefiro nem saber quem as escreveu, quero cantar.

Quando pede a um autor para escrever tem ideia do que quer?Em geral, eu peço que seja uma música romântica, independetemente se é um samba ou uma balada, eu sou muito ecléctica, eu canto qualquer tipo de música. Por exemplo, no caso do Milton Nascimento, quando lhe pedi uma música, chamada Cigarra, eu contei uma história para ele. E tem muitas em que aconteceu isto.

Nunca tentou escrever músicas para si própria? Não se sente tentada?Escrevi uma minha, mas arrependi-me e não tenho capacidade. Eu sou muito crítica em relação às coisas que escrevo e que toco, prefiro cantar as letras dos outros.

Prefere então exprimir a sua emoção pela voz e com as letras de outros?
Sim, porque quando se recebe uma música você torna-se dona dela. Você é proprietário dessa música, canta-se da maneira pessoal que se quer. Nem se consegue mesmo repetir uma música de forma igual.

Quais as canções que mais a marcaram nos últimos anos?
Tem muitas canções, é uma resposta díficil de dar. Há algumas que não foram grandes sucessos mas que existe um carinho e emoção enorme de cantar. Eu gosto muito de andar em frente e ouço constantemente músicas novas que quero cantar. A música não pertence a ninguém e pertence a todo o mundo, ela tem a sua maneira de interpretação, ela está viva, e cada pessoa canta da sua maneira e vê da sua maneira. Eleger algumas é complicado.



Vem a Portugal agora para uma série de concertos, um dos quais com o Luís Represas. Como surgiu a ideia de fazer um concerto com ele?Este concerto vai ser uma grande surpresa. Eu já o conheço há algum tempo porque temos um amigo em comum, o Ivan Lins e a gente quer que o público não saiba bem o que vamos fazer, mas vai ser um espectáculo muito bonito. Foi o meu empresário aqui em Portugal que sugeriu o dueto e tudo está encaminhando para ser uma coisa maravilhosa. E é possível que daí alguma coisa mais possa resultar. Ele é um grande músico, cantor e compositor.

Quando é que começou a vir para Portugal a dar concertos e o que acha do público português desde esse tempo?
A primeira vez que cantei em Portugal foi em 1976 ou 77, na Festa do Avante. De lá para cá eu venho com frequência. E, para mim, o público português é um dos melhores públicos do mundo. É maravilhoso, presta atenção na letra e dá o silêncio que é necessário, mas também a participação que também é fundamental. Eu dou concertos nos Estados Unidos, México, Japão e aqui é outra coisa.

O que pensa do intercâmbio cultural entre Portugal para o Brasil actual?
O problema é que, apesar de haver algum, não existe um intercâmbio forte entre os dois países. Porque a barreira maior seria a língua, que não existe e agora podemos estar aqui em breves horas. E nós devíamos trocar a arte, a música e pintura. É uma lástima a falta de intercâmbio, não entendo porque não há mais. Porque só teríamos que aprendeu um com os outros. Porque é que toda a colónia que fala a língua portuguesa não tem maior intercâmbio? Não percebo também. Porque a cultura é linda.

É muito comum no Brasil os músicos cantarem juntos. Gosta de cantar em conjunto?
É muito bom você dividir a experiência com outros músicos e cantores. Há dez dias atrás gravei um DVD com Ivan Lins e a Zélia [Duncan]. Foi maravilhoso e eu adoro podermos partilhar este momento único que é estar no palco. Faço isso há muitos anos, como é comum no Brasil e me encanta e só nos ajudamos mutuamente ao fazer isso.

O que tem no horizonte planeado para projectos futuros?
Não tenho nada em particular. Existe apenas uma ideia de fazer um novo disco com músicas em espanhol, ou um outro disco, cantando coisas novas de compositores variados. Mas os espectáculos são aquilo que prefiro e sigo sempre a partir daí.

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