segunda-feira, dezembro 12, 2005

francófono vs. anglófono

Born in the USA - opinião de Pedro Mexia in DN
Durante séculos, os portugueses cultos foram francófonos. O diagnóstico oitocentista está num texto de Eça chamado "O francesismo". E o exercício moderno está em ensaios de adesão e divulgação de Eduardo Lourenço ou Eduardo Prado Coelho, entre outros.

Nas últimas décadas, essa influência da cultura francesa (e da língua francesa) entrou em enorme decadência, logo substituída pela língua hegemónica e universal. Na minha geração, o inglês (e o inglês americano) domina tudo. Reconheço que a televisão, e depois o cinema e música popular, formataram a minha cabeça no americanismo cultural. E não são apenas os filmes e os discos consumo de preferência a excelente imprensa americana (New York Times, New Yorker, New Republic, Vanity Fair, Harper's, New York Review of Books, Atlantic). Acho que os ficcionistas americanos são os melhores em actividade Pynchon, Oates, DeLillo, Roth, McCarthy, Auster. E não vejo que a Europa tenha grandes alternativas, excepto em Inglaterra, que é de algum modo a continuação do mesmo. Assim, eu anglófono me confesso consumidor quase monopolista da cultura em inglês. Há pouco tempo, aliás, descobri que tenho mais livros em inglês do que em português.

Já tive algumas discussões curiosas com francófilos mais velhos (quase todos) ou da minha idade (um punhado). Os francófilos tendem a argumentar que 1) a cultura americana é inexistente ou nefasta 2) a cultura anglófona esmaga todas as outras 3) a cultura anglófona se afasta demasiado do marxismo e cai nos braços do liberalismo 4) a cultura inglesa é snob 5) a cultura anglófona é uma cultura do presente que não tem memória. Eu compreendo algumas dessas objecções, congratulo- -me perversamente com outras e outras rejeito totalmente. Mas digo que para mim ser anglófilo e anglófono é como viver em democracia um estado que me parece natural porque me lembro disso desde que tenho memória activa. E é um estado que além do mais aprecio. A anglofilia não é um mérito nem um demérito: é uma circunstância histórica. Se eu vivesse noutra época, talvez escrevesse alexandrinos. Talvez usasse chapéu com plumas. Ou talvez (tudo é possível) apreciasse políticos inchados como o senhor Chirac.

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